As cinco estações do amor, de João Almino, volta aos leitores depois de 24 anos da 1ª. edição de 2001, pela Record, acrescentado de excepcional fortuna crítica.
A obra circulou traduzida em diversas línguas e volta trazendo, dentre outros, o exigente Prêmio Casa de las Americas, de Cuba, que avalia não apenas a qualidade literária mas a importância do pensamento político exposto.
Os comentários críticos marcam os lançamentos mundo afora, como no México, onde o diplomata deixou saudades. Dos EUA vem a crítica do importante brasilianista de Yale, David Jackson. Vale destacar as importantes críticas mulheres como Mary Louise Pratt, da NYU, e Marjorie Perloff, comparativista de Stanford. A elogiosa leitura italiana ficou com o sofisticado Ettore Finazzi-Agrò, da Sapienza.
Quando li o As cinco estações do amor pela primeira vez partilhei da opinião de Silviano Santiago de que o autor “mói no áspero. Amor e amizade. Sexo e sensualidade. Desejo e violência” e muito me impressionei com o romance que tem como narradora uma mulher.
Como seria reler 24 anos depois? Aí está a surpresa que a narrativa provoca hoje. Não só as qualidades poéticas permanecem intactas, mas a peculiar construção de subjetividades: da mulher, dos negros, dos gays, dos transexuais.
Com especial sensibilidade vêm as dores de uma mulher madura, seus amigos e mesmo seus animais – espécies companheiras, como diz o a teórica feminista Donna Haraway.
Ana, escritora ficcional, se defronta hoje com importante leva de escritoras, mulheres que são senhoras da própria palavra e de experiências de vida como a de ter 55 anos e continuar em busca do amor.
Como disse Heloisa Teixeira, ainda em 2001 (na resenha Imersão no universo do outro), “o autor joga-se abertamente, sem intermediários, no feminismo”. E esse deslocamento da narrativa “quebra algumas normas éticas e estéticas” e, para finalizar: “É a vez de um acerto de contas”.
Junto, no entanto, vem a denúncia da violência que as transexuais sofrem cada vez mais ou as dificuldades de uma geração que viu o fim das utopias. E, nos exatos 40 anos da volta da democracia, a permanência da dor pelos desaparecidos políticos.
Ou seja, como diz Ana, a narradora, “As cidades mudam com o tempo, à medida que se tornam familiares. Não me sinto mais estrangeira em Brasília. Tenho outros olhos e outro coração para as paisagens de sempre”.
Tendo ido de Mossoró para o Planalto Central, dando voltas ao mundo, João Almino nos traz, novamente, seu sensível e inclusivo olhar para o Brasil.
Nós, as mulheres, em especial, agradecemos.
Abril de 2025
Beatriz Resende é professora Titular da Faculdade de Letras da UFRJ, pesquisadora do CNPq e da FAPERJ