Antônio Torres sobre HOMEM DE PAPEL

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João Almino nos brinda com o seu oitavo romance, com o qual acrescenta um ponto importante ao conjunto de sua obra – uma obra, diga-se, vigorosa e rigorosa, de intensa leveza narrativa, e que inclui o ensaio literário e escritos de história e filosofia.

Se no seu romance anterior, Entre facas, algodão, ele se fez o continuador da prosa realista, enxuta, metonímica de Graciliano Ramos, do mundo de casas repartidas dos meninos de engenho de José Lins do Rego, e até da poesia descarnada de João Cabral de Melo Neto, agora, com a pena da galhofa, tintas alegóricas, por vezes melancólicas, em outras utópicas e distópicas, João Almino resgata um personagem de Machado de Assis, e o enfia nas farsas e tragédias desse nosso tempo.

Homem de Papel tem como narrador o conselheiro Aires, que é transportado do Rio de Janeiro dos fins do século 19 e começos do 20 para a cidade projetada como um cenário modernista e que passa a ser associada ao que o país tem hoje como palco das mais acerbas e/ou retrógadas discussões, que, por óbvio, nem preciso nomear.

Se em Esaú e Jacó o conselheiro Aires está numa trama que envolve dois irmãos em disputa de uma mesma mulher, enquanto defendem regimes contrários (Monarquia e República), agora ele ganha protagonismo metamorfoseado em livro, do qual dá suas saídas para o mundo real – um mundo com as marcas da ignorância e da estupidez, bem visíveis nas quadras e ruas da capital federal.

O livro em que ele se abriga pertence à jovem diplomata Flor, trigêmea de Hugo e Miguel que, assim como os gêmeos de Machado de Assis, vivem em discórdia em razão de suas posições políticas.

Saturado de embates privados e públicos, restará ao conselheiro Aires o seguinte dilema:  voltar ou não voltar para dentro do livro. E nisso João Almino opera uma lição de literatura, como assinala o ensaísta e crítico literário português Abel Barros Baptista, no posfácio de Homem de Papel, por ele considerado surpreendente, inteligente e “divertidamente irônico, ou não fosse Aires o mais eminentemente personagem machadiano transportável para fora do livro e o mais eminentemente capaz de restaurar a necessidade de a ele regressar”, conclui o muito premiado ensaísta e crítico literário Abel Barros Baptista, professor da Universidade Nova de Lisboa, e autor de 3 livros sobre Machado de Assis.

Antônio Torres