Rosa-choque: João Almino fala das angústias femininas. Revista IstoÉ, sobre As Cinco Estações do Amor

/

IstoÉ, 22 de agosto de 2001

Rosa-choque: João Almino fala das angústias femininas

Darlene Menconi

Na década de 70, era costume falar de um futuro imaginário quando seria possível congelar uma pessoa que despertaria, anos depois, numa nova realidade. Ao se levantar do repouso ártico, viria o choque de saber dos amigos mortos, das pessoas e dos tempos mudados, das ilusões perdidas. Em As cinco estações do amor (Record, 208 págs, R$ 24), o diplomata, fotógrafo e escritor João Almino, ao contrário, mostra que não há nada melhor que saborear o tempo presente e viver o instante atual para testemunhar a perpétua mutação do universo. A emancipação feminina, a liberação sexual e a crescente violência urbana são o pano de fundo para a história de Ana, uma emancipada que sonha ser audaciosa e destemida.

Para cumprir um antigo pacto firmado entre os amigos de juventude, ela organiza uma festa de celebração à virada do milênio. Pouco a pouco, os amigos chegam e inicia-se o inevitável balanço de vida. O primeiro baque vem na figura de seu ex-namorado Norberto, que, depois de uma cirurgia e alguns mililitros de silicone, ressurge como o transexual Berta. A passagem do tempo fica ainda mais cruel quando a anfitriã resolve exorcizar o passado, limpando gavetas e lançando lembranças ao lixo.

Almino traduz com sensibilidade as angústias de Ana, mulher como tantas outras, obrigada a uma atualização perene de costumes. O livro trata de pessoas comuns, que vivem à espreita do eterno recomeço. Também fala dos vários tipos de amor, da paixão ardente à amizade banhada a sexo e, por fim, da insuportável consciência de que não existe o amor ideal. Poucos autores são capazes de traduzir os anseios e os desejos femininos com precisão. João Almino não é Chico Buarque, mas soube usar sua pena com maestria.

ISTOÉ/1664